Novidades da FSFLA
Boletim #14
1º de Setembro de 2006

*1. Editorial: Constituição do Brasil quer Software Livre no Governo

*2. Campanha de Combate a DRM

*3. FSFLA em Meios de Comunicação

*4. Eventos

*5. Participe da FSFLA

1. Editorial: Constituição do Brasil quer Software Livre no Governo

O Estado brasileiro do Rio Grande do Sul foi um dos pioneiros em legislar pela adoção do Software Livre na administração pública, com a Lei número 11871 [LEI] aprovada em 19 de dezembro de 2002. A lei estabeleceu que a administração pública deveria usar preferencialmente "software que seja aberto, livre de restrições proprietárias para sua cessão, modificação e distribuição."

A lei está sendo acusada na justiça de ser inconstitucional [INI], com o apoio de Amici Curiæ que historicamente estiveram do lado do software proprietário no Brasil [AC1], e a lei foi suspensa em uma corte federal apesar de a Advocacia Geral da União ter derrubado todos os argumentos [AGU].

A FSFLA está agora tentando se juntar ao caso como Amicus Curiæ também, com a ajuda de organizações já estabelecidas no Brasil, para corrigir alguns argumentos mal apresentados, como o que Software Livre significa, para apontar problemas reais na lei relacionados com sua definição de "software aberto" e para argumentar que a Constituição do Brasil já concede para o Software Livre, mesmo que implicitamente, a preferência da administração pública que a lei concede explicitamente.

Uma vez que a maioria dos princípios constitucionais usados em nossos argumentos são basicamente princípios de senso comum para a administração pública, nós esperamos que eles estejam disponíveis em muitos outros sistemas legais, esta é a razão pela qual nós traduzimos o texto, em uma tentativa de alcançar uma audiência mais ampla.

A lei

A lei define "software aberto" de acordo com as 4 liberdades da definição do Software Livre, exceto por um pequeno mas significante engano: ela diz que nenhuma restrição de qualquer tipo deve ser imposta ao exercício das liberdades. Isto infelizmente falha por não conceder a preferência à maioria do Software Livre existente, uma vez que mesmo as licenças mais liberais impõem restrições como manter as notas de direito autoral intactas, ou usar a mesma licença para a distribuição de trabalhos derivados. Contanto que as pessoas continuem a seguir o espírito da lei, concedendo a preferência mesmo onde a lei falha em fazê-lo, isto não deverá ser um grande problema.

É importante apontar que há casos nos quais a lei permite Software não-Livre, com justificativas como as que o Software não-Livre tenha claras vantagens sobre os programas com os quais compete, levando a um melhor retorno de investimento para a administração pública; e quando o uso de Software Livre causa imcompatibilidades com outros programas usados pela administração.

O ataque

Da forma que iniciou o processo, a lei está sendo acusada de inconstitucionalidade, no caso número 3059/03. Os argumentos apresentados na inicial [INI] são que leis estaduais não podem regular licitações públicas, pois tal controle é reservado à União; que a lei não respeita o princípio de isonomia (distribuição igualitária de direitos e privilégios) entre os licitantes; que a adoção de Software Livre infringe os princípios de eficiência e economicidade; e que tais leis só podem ser propostas pelo Poder Executivo, nunca pelo Legislativo.

Mesmo com a alegação da Advocacia Geral da União de que todos os argumentos são falhos [AGU], uma liminar foi concedida pelo Supremo Tribunal Federal, no qual tais casos são tramitados, e a lei está atualmente suspensa.

Enquanto isso, a ABES (Associação Brasileira de Empresas de Software) e a ASSESPRO (Associação das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação, Software e Internet), as organizações por trás da maior parte das campanhas contra cópias não-autorizadas de software (pirataria [SPI]) no Brasil, e que têm lutado contra o Software Livre, assinaram uma petição [AC1] para serem aceitos como Amicus Curiæ para este caso.

Seus argumentos contra a lei começam por apresentar o que eles enganosamente citam como diferenças fundamentais de natureza entre Software Livre e proprietário, dizendo que este "é destinado ao comércio, tem fontes fechados e é protegido por direito autoral", enquanto aquele tem "origens acadêmicas, fontes abertos e permite modificação, reprodução e livre distribuição,", assim confundindo duas dimensões ortogonais: proprietário x livre e comercial x não comercial, e confundindo as liberdades respeitadas por Software Livre com a mera disponibilidade de código fonte comunicada pelo termo praticamente sinônimo "Software de Código Fonte Aberto."

Então eles argumentam sobre a falta de garantia do Software Livre, como se transações comerciais envolvendo Software Livre não impusessem requisitos legais idênticos àqueles envolvendo qualquer outro tipo de software, e muitas outras falácias contra Software Livre que tenho certeza de que já ouviram antes. Eles completam repetindo argumentos que dão suporte a 3 das 4 alegações da inicial.

Nossa resposta

FSFLA, com apoio de entidades já estabelecidas no Brasil, está trabalhando para dar entrada numa petição de Amicus Curiæ que visa restabelecer o equilíbrio. Para esse fim, escrevemos um artigo de posicionamento no qual argumentamos que a Constituição Brasileira já estabelece princípios que são mais que suficientes para garantir ao Software Livre buscada pela lei suspensa e que, se a lei tem falha, não é por causa dos argumentos apresentados por seus oponentes, mas porque sua definição de Software Livre tem um erro. Isso não a faz inconstitucional: só a torna inoperante, ainda que na prática ela ainda tenha alcançado seu objetivo declarado quando seu espírito tenha sido seguido.

Nossos argumentos se baseiam nas quatro liberdades da definição do Software Livre:

(#0) executar o software para qualquer propósito,

(#1) estudá-lo e adaptá-lo às necessidades do usuário (exige código fonte),

(#2) distribuir o software da forma que foi recebido e

(#3) distribuir modificações feitas ao software (exige código fonte);

e os seguintes princípios constitucionais:

  • soberania: defender os interesses do país e dos cidadãos sem ser submisso a interesses estrangeiros;

  • impessoalidade: ausência de favorecimento injustificado de indivíduos ou empresas em condições similares;

  • moralidade: não usar uma posição pública em benefício pessoal;

  • publicidade: primariamente transparência, habilitando a sociedade a exercer controle sobre o governo;

  • eficiência: fzer o melhor uso possível dos limitados recursos disponíveis;

  • economicidade: gastar somente quando o retorno esperado é razoável;

Outros princípios econômicos declarados na Constituição também foram utilizados: a livre concorrência, a defesa do consumidor, a redução das desigualdades regionais e sociais, a busca do pleno emprego e o tratamento favorecido a empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no país.

Os argumentos apresentados abaixo são uma versão extremamente resumida que supõe alguma familiaridade com os modelos de negócio de Software Livre. O artigo completo [FSF] entra em muito mais detalhe tanto em explicar os vários modelos de negócios de Software Livre, com esclarecimentos de algumas suposições incorretas comuns, como nos argumentos e como eles se relacionam com os princípios constitucionais.

É fácil ver que a liberdade de usar o software, especialmente quando combinada coma liberdade de redistribuí-lo, contribui para a economicidade e a eficiência, no sentido de que ela permite que um único investimento beneficie toda a administração pública e até mesmo todos os cidadãos, e normalmente economiza o custo de licitações para licenciamento de software. Sem a liberdade para estudar e adaptar o software, a soberania está em risco, já que você não pode saber o que o programa faz, violando a transparência, e já que você não pode compartilhar com cidadãos o que os programas fazem, ou como a informação é tratada ou codificada.

As liberdades para estudar e adaptar o programa e distribuí-lo com ou sem modificações, combinadas, também contribuem para a economicidade e a soberania, no sentido de que habilitam a administração pública a contratar terceiros para manter software que um fornecedor abandonou ou falhou em manter satisfatoriamente. Isso, por sua vez, favorece a impessoalidade, já que de outra forma a escolha por uma plataforma de software favoreceria seu fornecedor por tanto tempo quanto ela permanecesse em uso (a razão pela qual a moralidade é freqüentemente tentada no momento dessas escolhas), e a livre concorrência, já que abre espaço para competição por serviços que de outra forma somente o fornecedor original poderia oferecer. Isso pode ser usado para favorecer pequenas empresas locais, o que aumenta o emprego, e para reduzir desigualdades, já que Software Livre torna monopólios mais difíceis de estabelecer.

Garantias que têm de ser oferecidas a consumidores pela lei brasileira também se aplicam a transações envolvendo software, mas garantias sobre software proprietário normalmente cobre apenas o suporte físico (a mídia); fornecedores de Software Livre, enquanto oferecem serviços de software, têm portanto de oferecer garantias reais, melhorando a defesa do consumidor.

Conclusão

Como ainda não estamos estabelecidos legalmente no Brasil, dependemos de terceiros para serem nosso representantes como Amicus Curiæ. Esperamos que o tribunal venha a aceitar a petição, se dermos entrada em tempo, de modo que nosso artigo possa ter chance de se contrapor aos conceitos errados apresentados na inicial e na primeira petição de Amicus Curiæ, e garantir que o termo Software Livre não seja para sempre comprometido no sistema legal brasileiro.

Como explicado acima e em mais detalhe no artigo, não importa muito se a lei for mantida ou derrubada. Mesmo não vendo razões constitucionais para derrubá-la, gostaríamos que a definição da classe de software que ela privilegia fosse melhorada de modo que ela correspondesse ao espírito da lei, já apoiado em nossa Constituição.

Ainda que entendamos que um processo como esse não seja o fórum apropriado para corrigir a lei, no artigo propomos uma definição alternativa que explica por que certas limitações às liberdades são aceitáveis, tais como as que garantem liberdades semelhantes a terceiros quando o software é redistribuído (copyleft), para garantir a preservação do crédito aos autores (não remover notas de direito autoral) e outras que possam servir a um propósito útil sem efetivamente limitar o exercício das liberdades (por exemplo, exigir a inclusão de uma certa sentença em material publicitário).

Mesmo nos opondo à lei atual, por ser inoperante e criar confusão sobre o significado de Software Livre (mesmo que use um termo diferente), esperamos que a lei seja mantida e corrigida, de modo que nem todos tenham de se tornar especialistas em dinâmica do mercado de Software Livre para compreender por que as quatro liberdades são necessárias para cumprir com todos os princípios constitucionais mencionados acima.

[LEI] Citada integralmente em [AGU].

[INI] http://www.kcp.com.br/diversos/adin_rs/inicial.pdf

[AGU] http://www.kcp.com.br/diversos/adin_rs/AGU.pdf

[SPI] http://www.gnu.org/philosophy/words-to-avoid.html

[AC1] http://www.kcp.com.br/diversos/adin_rs/amicus-abes.pdf

[FSF] http://www.fsfla.org/?q=pt/node/108

2. Campanha de Combate a DRM

A equipe de campanha contra DRM na América Latina segue trabalhando para definir estratégias e difundir detalhes sobre o que são DRMs, quais são os direitos que violam e quais as implicações políticas e jurídicas dos mecanismos técnicos de restrição de acesso e cópia de conteúdos digitalizados.

Neste momento, a equipe está definindo os detalhes para montar a página web da campanha, para em seguida continuar com outros mecanismos de divulgação, especialmente a campanha de chamadas de rádio que realizará a FM La Tribu da Argentina, emissora que se uniu ao nosso trabalho em defesa da liberdade em ambientes digitais.

A equipe da campanha sobre DRM trabalha numa lista de e-mail, acessível em http://www.fsfla.org/cgi-bin/mailman/listinfo/anti-drm

O documento de posicionamento sobre DRM elaborado pela FSFLA também está disponível em http://www.fsfla.org/?q=pt/node/100

3. FSFLA em Meios de Comunicação

Durante as últimas semanas, FSFLA teve numerosas aparições em meios de comunicação.

O portal de tecnologias Canal-ar da Argentina publicou várias notas relacionadas ao trabalho de nossa organização. Beatriz Busaniche participou de um vídeo onde explicou que é Software Livre, que impacto tem nos projetos de inclusão digital e qual é seu rol estratégico em nossas sociedades para a WebTV do Canal-ar.

Por sua parte, o jornalista Sebastián Premici pubicou uma nota intitulada "La amenaza de los DRM" (a ameaça dos DRM), com uma entrevista com Beatriz Busaniche, onde explica a natureza desses dispositivos e os direitos humanos que põem em risco; a nota está disponível em http://www.canal-ar.com.ar/Noticias/Noticiamuestra.asp?Id=3479 (espanhol)

O periodista Matías Aizpurúa do mesmo meio, escreveu um artigo completo sobre os mecanismos de monitorização dos sistemas operacionais proprietários disponível em http://www.canal-ar.com.ar/Noticias/NoticiaMuestra.asp?Id=3494(espanhol). O texto cita grande parte do trabalho do matemático Pedro Rezende, membro da FSFLA, sobre WGA, disponível em espanhol e português em http://wiki.fsfla.org/wiki/index.php/Wga_es. A nota ainda conta com uma coluna de opinião escrita por Federico Heinz e numerosas citações de trabalhos publicados por Richard M. Stallman.

Durante o mês de Agosto, FSFLA também participou do boletim do Sistema de Informação Universitária InfoSiu, com um artigo escrito por Beatriz Busaniche sobre ética hacker e sistemas de licenças livres para documentação e software. O texto completo do artigo está disponível no site do SIU em http://www.siu.edu.ar/InfoSIU/&edicion=16&nota=93 (espanhol)

Por sua parte, VivaLinux publicou o artigo intitulado "La FSFLA inicia campaña contra los DRM" (a FSFLA inicia campanha contra os DRMs). Ali, este portal dedicou uma nota completa à campanha em que está trabalhando a equipe anti-DRM, tanto em sua lista de correios como no wiki de recursos da campanha. A cobertura do VivaLinux está disponível em http://www.vivalinux.com.ar/eventos/fsfla-vs-drm.html (espanhol).

Enquanto isso, na quarta-feira 23 de agosto, Beatriz Busaniche particiou do programa "La mar en coche", no horário central da manhã da FM La Tribu na Argentina. Deste espaço pudemos conversar com jornalistas e ouvindes sobre a campanha da FSFLA contra DRM, contribuindo assim para a difusão pública dos perigos e ameaças que trazem as tecnologias de restrição digital de acesso e cópia de conteúdos.

4. Eventos

Beatriz Busaniche e Enrique Chaparro participaram do Consol 2006, o Congresso Nacional de Software Livre, realizado de 15 a 18 de agosto no Distrito Federal do México. Ali, ofereceram ao menos sete palestras nas quais abordaram temas tanto técnicos quanto políticos, em particular questões relacionadas a Patentes, DRM, licenciamento de Software e as ameaças vigentes à liberdade e à privacidade em ambientes digitais. Além disso, participaram de uma mesa redonda e uma palestra informal sobre as ameaças de multas que os mexicanos estão recebendo publicamente pelo uso de redes P2P. A FSFLA agradece pelo gentil convie dos organizadores do Consol e esperamos participar do Consol 2007!

Federico Heinz esteve em Montevideo, Uruguay, convidado pelo grupo de usuários de software livre desse país (Uylug). Federico participou com uma palestra nas Jornadas de Informática na Administração Pública e ofereceu uma conferência sobre DRM no DebianDay realizado em Montevideo.

Alexandre Oliva esteve em Lauro de Freitas, Bahia, Brasil, onde participou do III Festival de Software Livre da Bahia com suas palestras "As Ações Mais Legais da FSFLA: Fundação Software Livre América Latina" e "O Poder Liberdador do Segundo Dedo".

Entre 4 e 8 de setembro, Beatriz Busaniche visitará Oruro, Bolívia, onde participará do VI Congresso Nacional de Software Livre com uma palestra sobre os avanços no processo de atualização da licença GPLv3.

Por sua parte, a Associação de Bibliotecários da cidade de Rosário, Argentina, convidou Beatriz Busaniche a participar de suas VII Jornadas Regionais e V Provinciais de Bibliotecários, a se realizar nessa cidade nos dias 15, 16 e 17 de setembro. Nesse evento, trataremos de temas relacionados a Software Livre e acesso e difusão de conhecimento, junto com os bibliotecários que participarem do encontro.

Federico Heinz e Fernanda Weiden participarão do IV Wizards of OS que se realizará este ano de 14 a 16 de setembro em Berlim, Alemanha. http://www.wizards-of-os.org/index.php?id=63&L=3 Em sua turnê alemã, Federico participará também de vários eventos convidado pela Fundação Heinrich Boell.

5. Participe da FSFLA

FSFLA precisa de sua ajuda. Se lhe interessa contribuir a algum grupo de trabalho, unir-se às atividades da FSFLA e fazer parte das ações em andamento, não hesite em participar da equipe de sua preferência. A lista completa de grupos e formas de participação está publicada em nossa seção ¿Cómo participar? http://www.fsfla.org/?q=es/node/78 (a tradução para português em http://www.fsfla.org/?q=pt/node/79 está um pouco desatualizada neste momento, e você pode ajudar a corrigir isso!:-).