[Legales] [Ada Lemos] projeto de lei sobre licenciamento livre no Brasil

Alexandre Oliva lxoliva en fsfla.org
Dom Oct 15 20:37:22 UTC 2006


On Oct 13, 2006, Alexandre Oliva <lxoliva en fsfla.org> wrote:

> - Adicionei referência à convenção de Berna e TRIPS, levantando
> preocupação de que a lei viole alguns deles e sugerindo estudos
> cuidadosos, se é que já não houve

Uma sentença a mais no final do parágrafo, dizendo que pode ser bom
explorar os limites dos tratados mesmo assim.

Adiciono filmes à lista não exaustiva de formas de expressão que a lei
poderia cobrir.

Assino só eu, mencionando nomes de outros colaboradores.

Pretendo enviar algo bem próximo disso nas próximas horas se não
houver manifestação contrária imediata.

------------ próxima parte ------------
Prezado Sr José de Souza Pennafort Neto,
Excelentíssima Senadora Serys Slhessarenko,

Vimos por meio desta manifestar alguns receios e tecer alguns
comentários a respeito do projeto de lei de direito autoral que
regulamenta o licenciamento livre.


Vale inicialmente manifestar nosso repúdio ao uso do termo
"propriedade intelectual" na justificativa do projeto de lei.  Esse
termo é uma tentativa de abarcar conceitos inteiramente díspares,
governados por leis completamente diferentes, de forma a induzir a
aceitação da legitimidade de cada uma delas através da falácia da
propriedade sobre o intangível, ao invés de exigir que cada um dos
dispositivos que regula o intangível seja legitimado de maneira
independente como benéfico à sociedade.

Essa objeção é argumentada em maior profundidade em
http://www.gnu.org/philosophy/not-ipr.xhtml, infelizmente ainda sem
tradução para português no Brasil.  Como a justificativa do projeto de
lei está embasada exclusivamente na noção de direito autoral,
sugerimos substituir a generalização imprópria por esse termo
específico.


Temos algum receio de que esse projeto de lei conflite com tratados
internacionais que o Brasil tenha assinado, como por exemplo a
Convenção de Berna, da OMPI, e o TRIPS, da OMC.  Embora o TRIPS, em
seu artigo 13, talvez permita uma cláusula como essas, cremos que é
nosso dever manifestar nossa preocupação com relação a esse risco e,
caso uma pesquisa nesse sentido ainda não tenha sido realizada, que
seja, sob risco de a lei se mostrar inaplicável.  De todo modo, é
positivo explorar e forçar os limites desses tratados, se é pelo bem
público.


O Art 30-A proposto para a lei 9610 estabelece condições para o uso da
obra licenciada de forma livre e seu inciso II proíbe o uso
comercial.  Parece-nos que seria mais adequado para com o caput do
artigo garantir positivamente o uso não comercial, reservando ao
titular do direito autoral a possibilidade de permitir ou não o uso
comercial.

Cabe argumentar que a possível proibição de uso comercial conflita com
a compreensão corrente de licenciamento livre, a exemplo do termo
Software Livre, que exige permissão de uso comercial.  A proibição de
uso comercial descaracteriza o Software como Livre.  O uso do mesmo
termo `livre' com tal possibilidade de restrição pode causar confusão
e prejuízo ao nosso movimento, pelo que sugerimos ou a remoção do
óbice ao uso comercial ou a adoção de outro termo, baseado na noção de
'commons' subjacente à proposta.


Ainda que nos cause satisfação observar propostas de lei inspiradas em
tendências derivadas de princípios do Software Livre, causa-nos também
certo receio a provisão explícita em lei de modalidades de
"licenciamento livre."

Nosso receio a esse respeito é de que, caso o projeto de lei não seja
aprovado, surjam ainda mais receios infundados com relação à
legalidade do licenciamento de Software Livre, tanto no direito
privado quanto no direito público.  Convém deixar claro que tais
modalidades de licenciamento já são facultadas a titulares de direito
autoral, independentemente da lei, e que as definições são detalhadas
apenas por serem as modalidades recomendadas pelo artigo 2º do projeto
de lei.  De fato, convém explicitar o fato de que tratam-se de
definições, para não gerar esse tipo de dúvida.

Ao mesmo tempo, a provisão explícita remove alguns receios com relação
ao direito público, em que argumentos, em nosso entender infundados,
baseados no princípio da legalidade são levantados contra a
disponibilização de Software Livre pela administração pública.

Parece-nos que talvez fosse mais apropriado manter as definições de
"licenciamento livre" no próprio projeto de lei, ao invés de
introduzi-los como modificação à lei de direito autoral, já que são
redundantes com a lei pré-existente e fazem sentido apenas no contexto
do próprio projeto de lei.


Causa-nos certa estranheza a limitação da provisão do Art 2º a obras
musicais.  Parece-nos que a justificativa se aplica igualmente a
outras formas de expressão, de que trata a lei de direito autoral,
tais como obras literárias, software e filmes, entre outras.

Reconhecemos que a aplicabilidade do Art 30-B fica bastante limitada
no caso do software proprietário, uma vez que normalmente se faz
necessário o código fonte para a criação de obras derivadas.

De fato, tal distinção entre software e outras formas de expressão não
é nova.  No ordenamento jurídico atual, mesmo de um software em
domínio público não se podem de fato criar obras derivadas, em função
da falta de código fonte.

Por essa razão, propomos e defendemos (não necessariamente no contexto
deste projeto de lei) a exigência de disponibilização de código fonte
ou seu registro como condições para a aplicabilidade do direito
autoral sobre uma peça de software.  Sem essa exigência, software pode
não cumprir o propósito original do direito autoral, o de enriquecer o
domínio público mediante o incentivo à criação através de concessão de
monopólio temporário de exploração da obra.


A provisão do Art 2º do projeto de lei é condicionada à não reedição
da obra por um período de 10 anos.  Ao mesmo tempo em que a provisão
parece um passo correto no sentido de viabilizar o uso livre de obras
não mais exploradas comercialmente, temos receios com relação ao
significado de reedição (a lei 9610 define apenas edição), tanto no
contexto da Internet quanto no pré-Internet, não só com relação à
música mas também a outras formas de expressão:

- A oferta de download, comercial ou gratuito, ou mesmo publicação sem
intermédio de contrato de edição, de uma mesma gravação de uma música
ao longo do tempo seria suficiente para evitar a aplicabilidade do Art
2º do projeto de lei?  No caso de oferta via Internet, a mera oferta
para download seria suficiente, ou é necessário que haja algum
download para considerar que houve edição e reiniciar o contador de 10
anos?

- Uma edição da obra em qualquer lugar do mundo é suficiente para
reiniciar o contador de 10 anos, ou ela deve ocorrer no Brasil para
ter tal efeito?

- Em caso de nova edição após o prazo de 10 anos transcorrer sem
quaisquer edições, revogam-se permissões para uso da obra ou criação
de novas obras derivadas?  E quanto a uso e criação de obras derivadas
a partir de obras derivadas criadas antes dessa nova edição?

- Caso uma gravação original não seja reeditada por 10 anos, mas se
edite uma nova gravação de uma música durante esse período, derivada
ou não da original, a gravação original passa a estar sujeita aos
termos de licenciamento livre, ainda que em tese não se exija o
licenciamento livre da composição musical, em função de sua edição
noutra gravação?

- A mesma dúvida se aplicaria a obras literárias, se o projeto de lei
a elas se aplicasse.  Uma mera reimpressão caracteriza reedição, ou se
fazem necessárias modificações do conteúdo para reiniciar o prazo de
10 anos sem reedição?

- Caso o projeto de lei venha a se aplicar a software, questionamentos
similares também se aplicam: a publicação (edição?) de uma nova versão
de um software estende o prazo de 10 anos de uma versão anterior?  A
disponibilização de correções ou atualizações tem o mesmo efeito?

Talvez convenha, a fim de evitar as dúvidas acima, alterar o final do
Art 2º para: um prazo de 10 anos sem que a obra, ou obras dela
derivadas, tenham sido editadas ou publicadas.


Ainda que feita esta modificação, restam ainda receios.  Por exemplo,
a lei não especifica um conjunto específico de liberdades, mas uma
larga gama de escolhas disponíveis ao titular.  Isso impede o uso de
uma obra em termos de acordo com as diretrizes especificadas, caso se
mostre impossível contactar o titular do direito, ou o titular não
atenda à solicitação de licenciamento livre em tempo razoável, ou
mesmo se recuse a atendê-la.  Por isso, seria desejável uma
especificação mais precisa das liberdades que podem ser exercitadas
mesmo na ausência de anuência explícita do titular dos direitos.


Sem mais, manifestamos nossos protestos de estima e consideração,


Alexandre Oliva
Conselheiro, FSFLA


Também contribuíram para as considerações acima:

- Federico Heinz e Fernanda G. Weiden, conselheiros da FSFLA

- Richard M. Stallman, fundador da FSF


Sobre a FSFLA

A FSFLA, em processo de estabelecimento jurídico, uniu-se em 2005 à
rede de FSFs anteriormente formada pela Free Software Foundation dos
Estados Unidos, da Europa e da Índia.  Essas organizações irmãs atuam
em suas respectivas áreas geográficas no sentido de promover os mesmos
ideais de Software Livre e defender as mesmas liberdades para usuários
e desenvolvedores de software, agindo localmente mas cooperando
globalmente.  Para maiores informações sobre a FSFLA e para contribuir
com nossos trabalhos, visite nosso site em www.fsfla.org ou escreva
para info en fsfla.org.


Contato

Alexandre Oliva
Conselheiro, FSFLA
lxoliva en fsfla.org
(19) 9714-3658 / 3243-5233
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Alexandre Oliva         http://www.lsd.ic.unicamp.br/~oliva/
Secretary for FSF Latin America        http://www.fsfla.org/
Red Hat Compiler Engineer   aoliva@{redhat.com, gcc.gnu.org}
Free Software Evangelist  oliva@{lsd.ic.unicamp.br, gnu.org}


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